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Memórias de uma Guerra Suja: um livro em debate

05 jun

Por Thaís Barreto

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Aconteceu em São Paulo o lançamento do livro “Memórias de uma Guerra Suja” no auditório do Memorial da Resistência no último sábado (26/5) que contou com a presença dos autores Rogério Medeiros e Marcelo Netto. As revelações no depoimento do ex-policial que serviu ao regime militar, Cláudio Guerra, reacendem discussões e acrescentam desafios à Comissão Nacional da Verdade.

O livro polêmico divide opiniões, inclusive entre pessoas que foram presas e perseguidas durante a ditadura. Nessas circunstâncias, o Núcleo de Preservação da Memória Política, que organizou o evento,  foi alvo de muitas críticas. O ex-preso político Ivan Seixas defendeu que é importante conhecermos o depoimento do outro lado. “Esse é um debate político, em defesa da Comissão da Verdade e em defesa da memória brasileira”, afirmou Seixas.

Antes de Cláudio Guerra entrar nas páginas do livro, algumas coisas aconteceram. Aproximadamente 30 anos antes, o jornalista Rogério Medeiros trabalhava no Jornal do Brasil quando investigou alguns crimes cometidosno Espírito Santo e provou que ele não estava matando bandidos, sim lideranças camponesas. Durante a ditadura, acabou recrutado para servir ao Serviço Nacional de Informação (SNI). “Quem recrutou Guerra foi o procurador federal Geraldo Abreu, que está vivo”, revelou Netto.

Medeiros também trabalhou em parceria com Perly Cipriano, ex-preso político que ocupou a vaga de subsecretário de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, quando, juntos, denunciaram Guerra por proteger cassinos e envolvimento com tráfico de armas. “Depois da minha matéria ele caiu, a imprensa nacional foi para lá, ele mandava na polícia do Espírito Santo” afirmou Medeiros. 

Guerra acabou preso e pensava em esquecer tudo que fez, mas um fator religioso mudou completamente. Resolveu converter-se na igreja Assembleia de Deus. Mais adiante procurou Cipriano e Medeiros, surpreendendo, disse que tinha revelações a fazer. Os autores se juntam e Cipriano acompanhou decisivamente. Conheceram com mais detalhes o extenso currículo de um profissional da morte.

Profissional do crime

rogerio-medeiros“É preciso conhecer esse profissional do crime, agente da direita brasileira, que ainda jovem começou a matar para as elites rurais”, reiterou Medeiros. O jornalista Marcelo Netto acrescentou que Guerra nunca entrou em nenhuma lista de torturadores, tamanho o seu privilégio. Durante os três anos de entrevistas foi feito um delicado trabalho. Inicialmente Guerra só queria falar pela metade, não aceitava ter que dar nomes e envolver seus amigos.

Rogério Medeiros disse que se recusava a fazer o trabalho incompleto e que a ideia era uma narração em primeira pessoa. O trabalho foi convencê-lo. “A princípio ele queria as denúncias, alegava que virou pastor, que queria fazer uma separação da vida dele, deixar para trás esse passado dele contando. A gente disse, ou diz tudo ou nada. Houve um momento em que quase paramos”, relatou Medeiros. Guerra ficou 10 anos na cadeia, hoje está com 72 anos.

Rogério Medeiros

Os crimes que foram revelados resultaram no livro “Memórias de uma Guerra Suja”, o qual acabou tornando-se uma referência para o novo momento do país. Para Marcelo Netto o livro é uma imensa pauta e a imprensa nacional não está dando a devida importância. “Guerra disse que pode convencer outras pessoas a falarem. Estamos atualizando o site com novas informações, as procuradorias e a Polícia Federal estão agindo com base no livro”, acrescentou Netto.

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Marcelo Netto

Ivan Seixas lembrou o quanto é uma tarefa difícil estar frente a frente com o agente do crime. Como imaginar a sensação de Rogério Medeiros quando Guerra revelou que esteve duas vezes para matá-lo por conta das denúncias? O livro é uma referência legítima do encontro do passado com o presente.

 
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Publicado por em 05/06/2012 em Artigo

 

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